Review: Final Fantasy VII Remake

Square Enix se divide entre o clássico e o moderno neste aguardado jogo

Edisson Schwartzhaupt
9 min readSep 1, 2020

Não contém spoilers

Introdução

Na E3 de 2015 todos se surpreenderam com o primeiro teaser de Final Fantasy VII Remake para o Playstation 4. Com certeza foi um momento aguardado por muitos fãs do clássico Final Fantasy VII lançado em 1997. Porém, como todo processo de releitura de clássicos, muitos ficaram angustiados para o que a Square Enix estaria planejando. As ideias ficaram claras — ou mais confusas — quando Tetsuya Nomura foi anunciado como diretor responsável pelo projeto. Ele, que materializou o aguardado Kingdom Hearts 3 nesta geração, tinha agora o desafio de recriar esta obra prima dos RPGs japoneses e da história dos videogames.

Conforme fomos recebendo informações e novos trailers, nos demos conta das diferenças que seriam marcantes entre o remake e o clássico. Vimos a permanência no combate de ação, mas com elementos estratégicos, assim como elementos da história que já fugiam do que conhecíamos, e que mesmo assim despertaram curiosidade. Apesar disso, a fidelidade ao mundo de Final Fantasy VII já parecia bem captada desde o início deste que seria o primeiro capítulo do remake. Após 5 longos anos, o jogo foi lançado como exclusivo para o Playstation 4, no dia 10 de abril.

História

A narrativa de Final Fantasy VII é um ponto crucial, tanto para quem experimenta a franquia pela primeira vez quanto para quem já conhece seus jogos. Logo no início do remake somos recepcionados pelo grupo Avalanche, uma organização anarquista que visa destruir reatores que contém uma substância chamada mako, na cidade de Midgar. O mako é uma substância vital pro planeta, que está sob domínio da empresa Shinra. Basicamente, a trama gira em torno do embate desses dois grupos, com fortes críticas ao quesito ambiental, o qual gera uma notável desigualdade presente em seu mundo ficcional. No meio dessa desordem é inserido Cloud, o impopular protagonista, que ajuda a Avalanche como um mercenário e ex-SOLDIER — soldados especiais da Shinra.

Logo de cara o reconhecemos como “chato” e “velho”, um sujeito desinteressado, que evita contatos humanos e faz suas obrigações exclusivamente pelo dinheiro. Cloud se recusa a pensar nas causas planetárias pelas quais está lutando, mas aos poucos vai ganhando espaço na Avalanche, sendo cativado pelos integrantes. Essa parte ficou muito bem abordada, principalmente porque os personagens que são insignificantes no título original aqui ganham destaque e uma profundidade marcante na história. É satisfatório acompanhar novidades de personagens que existem desde 97, e nisso o novo título esbanja qualidade de conteúdo e ainda mostra que a linha nostálgica não é a única coisa que importa nesse lançamento.

Esse Final Fantasy molda uma personalidade própria durante sua narrativa. Enquanto a história preserva elementos que chamavam a atenção no passado, como as bebidas, a violência verbal e a polêmica cena de Cloud, ao mesmo tempo ela toma para si uma autenticidade. Isso é transmitido através do próprio mundo, da campanha principal, das quests secundárias e dos personagens — por menores que sejam seus papéis — que vão mostrando à nós e ao Cloud as tendências que permeiam nossa atualidade.

Final Fantasy VII Remake não tem medo de extrapolar, e isso é mostrado diversas vezes com o humor aleatório e peculiar que suas cenas carregam. Diversas vezes pensei em como isso poderia desagradar os fãs do FFVII original, mas no fundo eu torcia para ver mais. Durante algumas missões que se mostravam bobinhas ou emocionantes, vi desfechos tão esquisitos que pareciam mais um episódio de JoJo’s Bizarre Adventures. O estilo dessas missões secundárias lembram muito as de Final Fantasy XIII: Lightning Returns, que é um péssimo jogo. Porém, aqui tudo conversou e fez sentido conforme sua progressão, pois o mundo do FFVII é bem preservado, e as mudanças radicais nos acontecimentos só deram as caras no final.

Por fim, pode-se dizer que Final Fantasy VII Remake mantém a essência do seu universo original, mas não se importa em tomar suas próprias rédeas. Sua narrativa adiciona profundidade em seus personagens e suas abordagens políticas e midiáticas, mas insere também novidades que facilitam o diálogo com o jogador de hoje. Sua história literalmente retoma questões pertinentes do legado da franquia, mas entrega isso de forma autêntica, atualizada e com um excesso de extravagância. O equilíbrio entre o clássico e o novo se convertem aqui em ousadia e autenticidade.

Nota: 9,0

Jogabilidade

Quanto a jogabilidade, podemos começar falando sobre o combate. Neste quesito FFVII: Remake é fluido e instigante. Ele foge das batalhas de turno e vai para uma ação que exige um pensamento estratégico, uma atitude de se preparar para as lutas que surgem, equipando as armas e as matérias certas e fazendo um uso preciso dos summons e limite breaks. Isso também ocorre através do modo tático onde podemos selecionar nossas magias e poções de forma pausada, assim como trocar o personagem com o qual jogamos. Sua mecânica de combate não é travada que nem no Final Fantasy XV, e a interação na interface é mais versátil, lembrando muito Kingdom Hearts. Os contextos de batalha não são muito desafiadores, mas existem chefes que vão exigir um certo foco do jogador, não só em questão de estratégia, mas pela imensa quantidade de vida deles.

Essa ação toda discorre em fases bem lineares, sem muitos segredos, o que se mostra uma boa escolha — pensando no estilo das fases do FFVII clássico. O mesmo vale para os setores que passamos, onde se tem ruas estreitas, locais pequenos e intimistas onde compramos nossos itens, interagimos com NPCs e jogamos mini games. É evidente o cenário afetado pelas práticas poluentes da Shinra e pelo espírito de comunidade exercido entre os habitantes. Essa é outra diferença em relação ao FFXV: não temos um mundo aberto aqui. Nossa jogatina é bem definida, muitas vezes apresentando simples puzzles no progredir. A impressão é de que o aspecto de mundo aberto pode vir futuramente, na segunda parte do remake. Mas nessa geração serve bem como um contraponto ao FFXV.

Quanto à customização dos personagens, podemos escolher os upgrades de suas armas através do seu subnúcleo. Também podemos equipar matérias nos permitindo variações de habilidades e status. É fácil o acesso ao sistema, assim como elaborar suas mudanças visando builds diferentes para os personagens. Os tipos de matérias são bem diversificados e nelas contem magias e efeitos típicos da franquia.

Podemos concluir que a jogabilidade de Final Fantasy VII Remake é a melhor de um Final Fantasy nessa geração. Temos desenvoltura e liberdade para adaptar nossa party conforme as diferentes situações do jogo, assim como fluidez na movimentação e combate. A câmera aqui não é um grande problema igual parte dos RPGs de ação. Interagimos com uma fórmula familiar e direta, tanto nas batalhas, quanto na interação com NPCs do jogo. A variedade na construção de nossos personagens cabe ao jogador, e o jogo demonstra bem suas possibilidades em sua consistente jornada.

Nota: 9,5

Conjunto Áudio e Visual

Começando pela melhor parte, o áudio de Final Fantasy VII Remake é impecável. Temos participação do criador da trilha sonora original, e aqui presenciamos uma síntese do que há de mais clássico na trilha de Final Fantasy VII com o que há de mais moderno na temática do jogo. É realmente uma obra prima os sons que circulam nossa jogatina. Logo de cara ouvimos as tradicionais músicas do FFVII, mas, em alguns momentos mais descontraídos, imergimos em outro contexto, mais moderno e eletrônico. Sem falar nas versões jazz das trilhas, cutucando o estilo sonoro de Persona 5 Royal lançado no mesmo ano. Essa qualidade presente na música também se mostra nos efeitos sonoros e na dublagem. A atuação em inglês é muito boa, o que é algo raro e exclusivo em um jogo japonês, e que se encaixa perfeitamente nas características desses personagens que já conhecemos há anos.

No visual temos um trabalho regular, mas nada excepcional. Na verdade, o jogo tem uma estética linda, e é muito bom ver as cidades e os cenários recriados na Unreal Engine 4. Mas, ao mesmo tempo, temos uma qualidade gráfica que não impressiona. Algumas texturas são bem feias nos cenários, mostrando um desleixo causado talvez pelo fim da geração, assim como ocorreu com o já citado FFXIII: Lightning Returns. Isso não atrapalha em nada o jogo no geral, só não reflete aquela qualidade da franquia que estamos acostumados.

Nesse conjunto analisado o áudio brilha muito mais, mas o visual não é um aspecto ruim. A grande questão é que a trilha do jogo original é retratada de forma fiel e atualizada, permeando perfeitamente na atmosfera do mundo. A estética também é incrível, e jogar nos cenários de Final Fantasy VII em gráficos atuais é como passear por um lugar no qual não visitamos há muito tempo. Infelizmente, não parece que sua produção reflita os padrões de qualidade da Square Enix, porém vale lembrar que na próxima parte do Final Fantasy VII Remake poderemos ver seus gráficos deslumbrarem de vez.

Nota: 9,3

Custo Benefício

Na PSN o jogo custa o salgado preço de R$249,90 — isto após quase 5 meses de seu lançamento. No entanto, pode ser encontrado por preços mais baixos em outros sites e em lojas que vendam sua mídia física. Tendo isso em vista, o jogo possui uma duração de 45 horas sem muita exploração, então apresenta uma boa quantidade de entretenimento. Pensando no conteúdo pós-jogo, podemos passar das 80 horas para completar tudo que FFVII Remake nos oferece.

O jogo é recomendado para fãs de action-rpg e interessados na franquia Final Fantasy. Para quem busca uma experiência descontraída e com um desafio balanceado, FFVII Remake é um ótimo título que não desaponta em qualidade. Para os fãs do FFVII Clássico, a compra é obrigatória para ver essa repaginada em um dos jogos mais importantes da história do videogame.

Atualização 17/06/2021: No dia 10 de junho o jogo recebeu uma versão para a nova geração chamada Final Fantasy VII Remake Intergrade, que possibilita a transição de saves entre o PS4 e o PS5, corrige algumas texturas e disponibiliza conteúdo extra apresentando a personagem Yuffie.

Nota: 9,0

Considerações Finais

Final Fantasy VII Remake revela uma tentativa de se libertar a todo custo de um destino determinado lá em 1997. Temos aqui um título que conversa mais com o nosso tempo, apesar de ressaltar as críticas que o jogo original apresentava e que continuam válidas até hoje. É nos dado toda a personalidade de Final Fantasy VII recriada para uma nova geração. Um começo da narrativa, que tenta ressaltar questões como a preservação, o passado e o destino. Aspectos que têm total relação não só com os acontecimentos do jogo, mas com a história do título para nós jogadores.

Essa primeira parte de FFVII Remake aflora todas memórias desse universo e torna acessível a sua jogabilidade. Presenciamos, também, um frescor em sua narrativa, uma maestria no aspecto sonoro e uma estética que brilha os olhos de qualquer um que conheceu Midgar nos primeiros gráficos do Playstation 1. Mas não se engane: o universo linear e intimista, os personagens reconfortantes e a nostalgia que atingem o núcleo de seu audiovisual nos preparam para algo maior, tanto em abrangência quanto em mudança. Por ora, vale dizer que esse primeiro momento na nova vida de Final Fantasy VII resguarda boas memórias e expectativas intrigantes para o futuro, e que lá no fundo guarda novidades pelas quais nem sabemos o que esperar.

NOTA FINAL: 9,3

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